Por Nonato Furtado
“Este é tempo de divisas, tempo de gente cortada... É tempo de meio silêncio, de boca gelada e murmúrio, palavra indireta, aviso na esquina.”
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
O programa “Educação em debate” de sábado, 10/07/10, recebeu uma ligação de uma senhora que nos chamou muito a atenção. Ela relatava que estava há aproximadamente 35 (trinta e cinco) anos fora de Pentecoste, morando em São Paulo, e que tinha ficado maravilhada com as inúmeras mudanças na cidade. O curioso foi que a ligação aconteceu logo depois que estávamos comparando o desempenho do município com outros vizinhos baseados nos resultados do IDEB. Na comparação, pontuávamos que Pentecoste precisava avançar bem mais.
A ouvinte, inclusive, parabenizou o prefeito e a câmara de vereadores pelas “mudanças” acontecidas na cidade. Segundo ela, era muito importante o trabalho da administração municipal. Concluída a participação da senhora, imediatamente, outro ouvinte ligou fazendo inúmeras ponderações. Os apresentadores do programa, por sua vez, também fizeram suas considerações. Mostrando vários pontos que devem ser considerados nessa mudança. Mas, realmente, o que mudou em Pentecoste nas últimas décadas? O que dizer então?
Para começarmos a reflexão, é interessante considerarmos que Pentecoste realmente mudou. Mas, o que? Segundo o IBGE, o município conta com uma população atua de 35.166 habitantes. Podemos pegar o ano de 1996 como referência, nessa época o município tinha 28.621 habitantes, ou seja, 6.545 habitantes a menos. Quantos habitantes teria o município no final da década de 1970? Rapidamente, podemos afirmar que Pentecoste cresceu em termos populacionais e quem saiu daqui há mais de três décadas realmente vai perceber esse impacto. O aumento da população provocou outras mudanças como crescimento do comércio local, vinda de outros serviços para a cidade, construção de prédios públicos, construção de novas casas, conjuntos habitacionais, igrejas, dentre outros.
Além desses fatores, a época que a senhora toma como referência é auge da Ditadura Militar. Época de repressão, censura, intimidação, violência (dos mais variados tipos) e pistolagem. Esses fatores são refletidos na conjuntura municipal em um coronelismo altamente repressivo. Conhecemos quantas histórias dessa época? Quantas famílias perderam seus entes queridos? Quantas pessoas simplesmente “desapareceram”? Quantas foram expulsas da cidade? Quantos bandidos tiveram a vida divulgada como heróis? Quantos tapas na cara? Quantas bocas silenciaram? Quantos ainda sonham reviver esse período? Eu já ouvi coisas do tipo: “Época boa era a da Ditadura”! Boa pra quem? É desse tempo que fala o texto de Drummond em epígrafe. Ao compararmos com a atual conjuntura nacional realmente dá para ficar impactado.
Junto com o crescimento também vieram algumas mazelas sociais, a violência no trânsito fruto aumento dos números de automóveis e do não planejamento, drogas, roubos, furtos, assaltos, prostituição infantil, estelionato, empresas fantasmas e tantos outros. Não era muito comum ouvir falar de assalto nas ruas de Pentecoste naquela época. Falar em crak era falar da famosa seleção de 1970, a do Tricampeonato.
Realmente, a cidade cresceu, mas não podemos confundir crescimento com desenvolvimento. Nesse contexto, são palavras com significados diferentes. A cidade cresceu, mas não devemos atribuir isso somente a atual administração e à nossa apática câmara de vereadores. Não, de forma alguma. Esse crescimento é histórico. Mesmo assim, o município não se desenvolveu suficientemente para recebê-lo. Em muitos aspectos, ainda temos um município com características muito semelhantes ao da década de 1970.
Vamos terminar, ilustrando com um simples exemplo: Quais eram as opções dos jovens de Pentecoste ao concluir o ensino médio (antigo 20 grau) na época citada pela senhora? Quais as que temos hoje? É isso, acho que não é necessário me alongar muito não. Você é uma pessoa inteligente e já captou a mensagem. Era o que eu tinha a dizer. Obrigado pela atenção.
Nonato Furtado é Mestrando em Linguística (PPGL/UFC), graduado em Letras (Português –Espanhol) – UFC, graduado em Pedagogia – UVA. Atua como professor de Língua Espanhola na graduação dos cursos semipresenciais da UFC/UAB, ministra palestras sobre Literatura Brasileira em escolas de Fortaleza, um dos atuais articuladores do Programa de Educação em Células Cooperativas – PRECE (Extensão da UFC). Escreve contos, crônicas, e envereda pela poesia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário